A proposta deste texto é apresentar o que existe na literatura científica em relação ao tratamento das dores cervicais via técnicas articulares manuais. Foi dada ênfase aos valores de diminuição da dor e apresentação (ou não) de melhoras significativas do tratamento, tanto em relação á dor quanto à função. Em relação à qualidade dos estudos, buscou-se apresentar apenas artigos com avaliação no PEDRO (http://www.pedro.org.au/) maiores que 6 (7 ou mais).
Um detalhe adicional: TODOS os estudos foram realizados vinculados a instituições de Fisioterapia especificamente (exceto um, o de LAU et al - 2011) vinculado ao departamento de ciências da reabilitação da universidade politécnica de Hong Kong).
Manipulação Articular Cervical
Com apenas 3 sessões de tratamento (1 semana), indivíduos com dor cervical tiveram sua dor praticamente zerada com o uso de manipulações articulares na coluna cervical e um programa de exercícios. De fato, realizaram 3 sessões durante a primeira semana, e duas na segunda semana de tratamento, para um total de 5 sessões. A dor inicial média desses pacientes era de 3,6 (escala numérica de dor) e os resultados se mantiveram após 6 meses, de acordo com PUENTEDURA et al (2011) (PEDRO 8). Este estudo comparou os resultados da aplicação de manipulações torácicas às manipulações cervicais (adicionais, em ambos os casos, a uma rotina de exercícios de amplitude de movimento e força) em indivíduos com dor cervical e que respeitavam uma Regra de Predição Clínica desenvolvida para se tratamento das dores de pescoço via manipulação torácica (CLELAND ET al - 2007, não validada para a coluna torácica, posteriormente, conforme CLELAND ET al -2010) . Na comparação entre os grupos, a melhora sintomatológica e funcional foi maior e os resultados mais rápidos no grupo que recebeu manipulação cervical em relação à torácica.
Com base também no estudo anterior acima (PUENTEDURA et al - 2011) PUENTEDURA et al (2012) (PEDRO não definido - 82 participantes) afirmam ainda que talvez seja possível prever os pacientes mais propensos a se beneficiar das manipulações cervicais nos casos de dores. Eles estabeleceram uma Regra de Predição Clínica que envolvia 4 ítens, sendo que a presença de 3 destes parece suficiente para predizer uma melhora (definida como uma melhora auto-relatada pela escala global de graduação da mudança - "global rating of change scale - GROC"), sendo os ítens:
1) dor a menos de 38 dias;
2) expectativa de que a manipulação cervical vá ajudar;
3)diferença na ADM de rotação maior que 10 graus entre os lados; e
4) dor na compressão ("spring test") póstero-anterior da coluna cervical média.
De uma probabilidade geral de 39% de melhora (ou seja, sem se usar a RPC cerca de 39% das pessoas se beneficiariam do tratamento) a presença de 3 ítens leva a uma probabilidade de 90% de melhora (a presença de 4 ítens levaria a praticamente certeza de que ocorreria a melhora). Além disso, os indivíduos que respeitavam a RPC tiveram uma melhora da dor de 3,5 pela escala numérica comparado a 1,1 dos indivíduos que não respeitavam a regra, além de uma diferenças significativa do ponto de vista funcional. Ressalta-se que este é um estudo inicial, e que necessita de bons estudos subsequentes para que possamos, de fato, dizer que essa Regra de Predição Clínica é, realmente, válida.
O exercício utilizado nesses estudos é uma mobilização ativa da cervical, consistindo de 10 repetições a serem realizadas 3 a 4 vezes ao longo do dia. Pede-se ao paciente que flexione o pescoço até uma distância de 3 dedos do tórax (coloca-se a mão - 3 dedos - como referência), e roda-se o pescoço para um lado e para o outro mantendo-se a flexão.
Em suma, a manipulação cervical (combinada de um leve exercício de mobilização ativa da coluna cervical) parece um recurso útil no tratamento das dores de pescoço em pacientes selecionados. Porém, devido à escassez de estudos, seria interessante que outras pesquisas com ênfase na utilização da manipulação cervical fossem publicadas, para que pudéssemos afirmar isso com mais embasamento. Similarmente, são necessários mais estudos antes de podermos afirmar que a Regra de Predição Clínica Apresentada é realmente válida.
Potencializando a Manipulação (ou mobilização) Cervical através da Manipulação Torácica
SAAVEDRA-HERNANDES et al (2013) (PEDRO 8 - 82 participantes) mostrou que o uso de manipulações torácicas (e cervico-torácicas) adiciona à redução das limitações funcionais relação à manipulação exclusivamente da coluna cervical, mas não em relação à dor ou amplitude de movimento. Em detalhe, o uso de manipulações é rápido e levou menos do que 5 minutos. Foi realizada apenas uma sessão e a redução da dor, observada na reavaliação feita uma semana após o tratamento, revelou uma diminuição da dor de aproximadamente 4,8 para 2,7 em ambos os grupos, ou seja, não houve diferença significativa, o mesmo ocorrendo em relação ao aumento de amplitude de movimento do pescoço. Porém, em termos funcionais, a melhoria do grupo que recebeu manipulações torácicas foi significativamente maior na avaliação pelo "Neck Disability Index".
MASARACHIO et al (2013) (PEDRO 7 - 64 participantes) mostrou que pacientes com dor cervical obtêm benefícios com a adição de manipulações torácicas à combinação de mobilização cervical e exercícios (os mesmos citados anteriormente, dePUENTEDURA et al - 2011), em indivíduos com dor cervical. O tratamento consistiu de 2 sessões em uma semana, com a reavaliação realizada uma semana após a primeira sessão. Esta identificou melhora da dor (de 5,1 para 2,2 na Escala Numérica, comparado a 4,9 para 3,5 no grupo sem manipulação torácica) e da função significativamente maiores no grupo que realizou manipulação torácica adicional.
O uso das manipulações torácicas parece, de fato, beneficiar um tratamento dirigido à coluna cervical.
manipulações torácicas não apenas podem ser úteis,
como podem adicionar benefícios à manipulação cervical
Manipulação Articular Torácica
CLELAND et al (2005) (PEDRO 8 - 36 participantes) comparou manipulações torácicas a placebo em seu estudo com indivíduos com dor cervical crônica (média de 12 semanas, aproximadamente), e avaliou os resultados imediatamente após a aplicação das técnicas. O grupo que recebeu a manipulação tinha dor inicial média de 41,6 na escala visual analógica, indo para 26,1 logo após, o que foi uma melhora significativa do ponto de vista clínico e estatístico, e o grupo placebo que tinha uma valor inicial da dor de 47,7, foi apenas para 43,5.
LAU et al (2011) (PEDRO 8 - 120 participantes) também buscaram observar a melhora de se fornecer manipulação torácica, dessa vez adicional a tratamento com Luz Infravermelha e um panfleto educacional. Logo após o tratamento (8 sessões em quatro semanas) o grupo que recebeu manipulação, cuja dor inicial (escala numérica) era de 5,02 foi para 3, 14, enquanto o grupo que não a recebeu foi de 5,05 para 4,37, com os resultados em ambos os grupos mantidos após 6 meses do fim do tratamento. A melhora funcional também foi maior, mas não atingiu níveis de significância estatística. Além disso, houve uma aumento significativo da amplitude de movimento do pescoço nas pessoas tratadas com a manipulação torácica, tanto imediatamente após o fim do tratamento (somente para flexão) quanto 3 e 6 meses após o fim do tratamento (todas as direções, exceto rotação).
CLELAND et al (2010) (PEDRO 7 - 140 participantes) também observaram benefícios com o uso da manipulação torácica em indivíduos com dor cervical. Eles compararam dois grupos, um que recebeu apenas exercícios com outro que, além dos exercícios, recebeu manipulação da coluna torácica. Foram realizadas 5 sessões de Fisioterapia, num período de 4 semanas, sendo que além de alongamentos para a musculatura do pescoço, foram incluídos exercícios de fortalecimento da musculatura flexora profunda do pescoço, isometria cervical, exercícios de fortalecimento para trapézios inferior, médio e serrátil anterior (sempre 10 repetições mantendo a contração por 10 segundos), sendo que o grupo que recebeu manipulação adicional iniciou exercícios somente após o início da segunda semana de tratamento. Os resultados mostraram uma diminuição da dor de 4,4 para 2,3; 1,7; e 1,4 no grupo que recebeu manipulação adicional (respectivamente 1 semana, 4 semanas e 6 meses após o início do tratamento) e de 3,9 para 3; 1,9 e 1,8 no grupo que recebeu somente exercícios, sendo essa diferença significativa somente no primeiro acompanhamento. As diferenças na avaliação funcional (pelo "Neck Disability Index") também favoreceram o grupo que recebeu manipulação de forma estatisticamente significante em todos os acompanhamentos.
A aplicação de manipulações torácicas parece um recursos realmente útil, com resultados positivos a curto e alongo prazo.
Manipulação versus Mobilização
DUNNING et al (2012) (PEDRO 8 - 107 participantes) mostrou que o uso de manipulações nas regiões torácica alta e cervical alta é melhor que o de mobilizações para o tratamento de dores de pescoço. Com apenas uma sessão, aqueles que receberam manipulações, na avaliação feita dois dias depois, tiveram uma melhora estatisticamente significativa de 3,3 pontos na Escala Numérica de Dor (5,6 para 2,3), enquanto naqueles que receberam mobilização a melhora foi de 0,9 ponto (de 5,3 para 4,4). A melhora funcional e de amplitude de movimento (teste de flexão-rotação da coluna cervical) também foi significativa e clinicamente maior no grupo que recebeu manipulações.
CLELAND et al (2007) (PEDRO 7 - 60 participantes) obtiveram maiores benefícios em pacientes com dor cervical, através do uso de manipulações, em relação a mobilizações, da coluna torácica. Foi realizada apenas 1 sessão, com reavaliação feita de 2 a 4 dias depois, e o grupo que realizou manipulação, cuja dor inicial (escala numérica) era de 5,3, teve a dor diminuída para 2,7, enquanto no outro grupo a dor foi de 4,5 para 3,9. A melhora não foi apenas em relação à dor, mas também em termos de função (mensurada pelo "Neck Disability Index").
SURVANNATO et al (2013) (PEDRO 7 - 39 participantes) estudaram indivíduos com dor cervical a mais de 3 meses, e encontraram resultados semelhantes, em relação à dor, com o uso de manipulações ou mobilizações torácicas aplicadas, supostamente, em um único e definido nível vertebral. As reavaliações após o tratamento foram feitas imediatamente e 24 horas após o atendimento, e mostraram que, embora para a dor ambos os tratamentos tenham propiciado benefícios semelhantes, a amplitude de movimento naqueles que receberam a manipulação foi significativamente maior (extensão e rotação lateral esquerda) imediatamente após a aplicação, não se observando isso 24 horas depois.
IZQUIERDO PEREZ et al (2014) (PEDRO 9 - 51 participantes) não encontraram diferenças nos resultados da aplicação de manipulações, mobilizações e mobilizações com movimento em indivíduos com dores cervicais. Os participantes receberam 4 sessões de Fisioterapia em duas semanas, e as avaliações foram feitas imediatamente, 1, 2 e 3 meses após o fim do tratamento revelaram não haver diferenças entre os grupos
Como não foram realizados acompanhamentos a médio ou longo prazo, podemos dizer que o uso de manipulações torácicas parece, no curto prazo, trazer maiores benefícios que o uso de mobilizações torácicas no tratamento das dores cervicais. Por outro lado, o uso de manipulações cervicais não parece trazer mais benefícios que outras técnicas articulares (mobilizações ou mobilizações com movimento em coluna cervical) para as dores ou limitações funcionais em pessoas com dores cervicais.
Considerações Finais
Aparentemente, no tratamento de indivíduos com dores cervicais, o uso de manipulações da coluna cervical não parece mais eficaz que o de outros tratamentos dirigidos à mesma região, como mobilizações articulares ou mobilizações com movimento. Ainda assim, o uso das manipulações cervicais parece útil para um grupo clinicamente selecionado de indivíduos. As manipulações torácicas, por sua vez, também são condutas úteis no tratamento de indivíduos com dores cervicais, tanto a curto como longo prazo, sendo que sua aplicação pode potencializar ainda mais os benefícios das manipulações cervicais e, no curto prazo, sua aplicação aparenta ser mais eficaz que o uso de mobilizações torácicas.
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